Por Marcellus Nishimoto
O bem sucedido processo de gestão de imagem de Lady Gaga não está centrado na habilidade de criação de estridentes visuais ou de controversas declarações. Manifesta-se na original capacidade de criar vontade de ação em seus apreciadores mais entusiasmados. Ou seja, o desejo de vivenciarem, pessoalmente, as imagens hiperbólicas da cantora. Eles reproduzem desde as roupas performáticas apresentadas por ela, os clipes com múltiplos fragmentos da cultura pop ao comportamento teatralizado nos ambientes públicos. A teia de referências é tamanha que a House of Gaga – o coletivo de mais de 100 pessoas responsável por estudar, idealizar e construir as imagens da cantora – consegue estabelecer, em algum momento, um ponto de contato com a memória visual e afetiva de cada espectador. A performance racionalmente heterodoxa de Gaga quebra alguns tabus de comportamento e incentiva os fãs a vivenciar uma exposição instantânea, em escala global, nas comunidades sociais como o Youtube. Ai mora o grande trunfo. Seus admiradores, munidos da tecnologia atual e no processo de reprise doméstica da artista, são a parte ativa e mais significativa na manutenção contínua da persona de Lady Gaga. Os vídeos caseiros – alguns bem produzidos –, em paródia ou admiração se multiplicam exponencialmente e são assistidos por milhões de pessoas, tornando os novos avatares de Gaga em celebridades imediatas.
As músicas são, por obviedade, o ponto inicial de contato da cantora. Suas composições são soluções aprendidas do repertório pop, sem pretensas vontades. Mas também são construídas no mesmo método das imagens: com multi-citações do passado recente em cruzamento estético dançante. A última música de trabalho da cantora, Alejandro, possui a batida que relembra instantaneamente o som do sueco Ace of Base, grupo dance de sucesso nos anos 90. O clipe da composição revisita a diva declarada da artista, Madonna, tanto nos apelos coreográficos quanto nos figurinos assinados, agora, por Giorgio Armani. Os vídeos das músicas Vogue e Express Yourself, ambos de Madonna, e o estilista Jean Paul Gaultier são parodiados como se Lady Gaga fosse, também, um avatar da rainha do pop. Uma Gaga em comportamento auto-apreciativo semelhante aos seus fãs digitais.
Ao criar esse caldeirão de referências, Lady Gaga valida e toma a dianteira na conveniência de se fantasiar e viver a personagem do homenageado, ou vários. Madonna sempre se preocupou em criar tendências quando elas eram ainda sistematicamente ditadas pela elite. Misturou-as com as ruas, definiu comportamentos, serviu de canal para a legitimação da multiplicidade de gêneros e sexualidades. Foi a precursora do chamado marketing pessoal, alimentando a mídia de acordo com as suas necessidades. E se valeu de um staff de colaboradores em sintonia com as tendências apontadas como emergentes. A originalidade e superação de Lady Gaga está na reprise fragmentada e plural de espíritos anteriores, na mudança radical e quase imediata de sua imagem e no entendimento absoluto do discurso pop de Andy Warhol: "todos terão seus 15 minutos de fama"; ou, no caso, 9:59 minutos, o tempo máximo de um vídeo no Youtube.
PS: O Youtube anuciou (28-07-10) que acaba de aumentar o tempo de upload dos vídeos para 15 minutos. Andy Warhol era um profeta.
Números de Lady Gaga Corp. © Época Negócios |